A redução da maioridade penal, de 18
para 16 anos, será votada nesta semana. Por ser um tema importante, implica prós e
contras, e merece conhecimento e
reflexão.
Os crimes praticados por adolescentes
estão cada vez mais frequentes e violentos. A primeira atitude da sociedade,
inflamada pela comoção, é desejar castigá-los duramente. O argumento recorrente
para justificar a maioridade penal baseia-se no óbvio: se o jovem tem
capacidade para arquitetar um crime, lançar mão de uma arma e matar, ele também
pode ser responsabilizado pelo ato do qual teve consciência e participação nele,
como se fora adulto. A revolta acomete a
todos e, conforme a gravidade do delito, o clamor se eleva exigindo punição
severa.
No entanto, para o bem do menor
infrator e da sociedade, a solução não é tão simples assim. Muitas entidades e inúmeros juristas de
renome são contra a medida. Pontuam que
o adolescente levado às prisões brasileiras, vai se sentir desamparado e
inseguro ao se deparar com uma situação nova, sujeito ainda à violência,
inclusive sexual. Conforme alerta o
doutor Dráuzio Varela, o jovem, no convívio com bandidos de longa
data, profissionais do crime, e mesmo por sobrevivência e fragilidade, deverá
se unir a uma das facções criminosas do presídio. Terá, então, apoio, dinheiro
para pagar a ida da mãe às visitas e ajuda à família. Cumpre a pena e sai
comprometido com os criminosos. Como não tem, muitas vezes, estrutura familiar
sólida, escolaridade, e já envolvido
nesse submundo, seguramente vai continuar no crime, na venda de drogas e levado
a trilhar outros caminhos obscuros. Então, a prisão só como castigo, não
surtirá bom efeito.
O objetivo da prisão é punir e reabilitar
para que o detento volte à sociedade apto a conviver. A cadeia, como se tem
visto, não tem reabilitado ninguém. O sistema prisional brasileiro, cheio de
falhas, é outra questão a ser considerada. Haja vista a superlotação dos
presídios brasileiros que coloca o país no 4º lugar do mundo, atrás somente dos
Estados Unidos, China e Rússia.
Se as medidas socioeducativas fossem
cumpridas, certamente haveria melhor resultado.
O ECA (Estatuto da Criança e do
Adolescente) aponta os estágios dessas medidas: advertência, obrigação de
reparar o erro, prestar serviços comunitários, liberdade assistida,
semiliberdade, internação. O adolescente pode ficar até 9 anos na medida
socioeducativa: 3 anos interno, 3 anos semi-interno e 3 anos em liberdade
assistida. O Estado deverá acompanhá-lo
e ajudá-lo em sua reintegração na sociedade.
Órgãos internacionais recomendam que, na execução das medidas
socioeducativas, haja um sistema de justiça
especializado para julgar, processar e responsabilizar menores de 18 anos. Essas medidas podem ser a solução, mesmo
porque não adianta endurecer as leis se o Estado não as cumpre. Portanto, o
ingresso de adolescentes em nosso sistema carcerário só faria aumentar o número
de bandidos, pois os afastaria das medidas socioeducativas.
É preciso ressaltar que não há dados
comprobatórios da eficácia da redução da
maioridade. O rebaixamento da idade não
tem reduzido a criminalidade infantil em países que o adotaram. O que se tem provado é que a ação dos
governos e da sociedade nas instâncias psíquicas, sociais, políticas e
econômicas, contribui realmente para a diminuição dos crimes cometidos por
menores. Também, os dados da UNICEF
mostram que em países que adotaram as medidas socioeducativas com precisão, o
índice de reincidência é de 20%, e 80% são recuperados.
Tratar-se do efeito e não da causa,
não resolve. Sob esse aspecto, é imprescindível
lembrar que o adolescente infrator não surge por acaso. É fruto da
injustiça social que agrava a pobreza em que vive, seguida da falta de afeto
familiar e Educação – direito básico do cidadão. A punição inadequada nas
prisões tira do jovem a chance de se tornar um cidadão consciente e feliz. A
maioridade penal tem caráter de vingança e não de solução. Segundo o jurista
Marcus Vinícius Furtado Coelho, presidente da OAB, o Estado que não tem
políticas educacionais , de Saúde, de lazer, de desporto, e que não possui uma política de
entrada do adolescente no mercado de trabalho, que não cumpre um sistema para reeducar,
certamente não possui legitimidade para
diminuir a maioridade penal.
Por todos esses motivos, talvez não
valha a pena jogar os menores infratores na cadeia. Ela não os entrega
melhorados à sociedade. Só serve para
lavar a consciência dos que se omitem diante de medidas de recuperação
eficazes, mas que, por incompetência ou descaso, são esquecidas.
Se cada votante pensasse no filho menor de
idade lançado nas masmorras brasileiras, talvez lutasse mais para que as
medidas socioeducativas fossem cumpridas.
Quando vejo menores assassinos na tela da TV, penso: veja o que nós
fizemos com ele...