A pretensa demolição do Cine
Brasil causou alvoroço na cidade. E com razão. Ele faz parte da Memória de
Caratinga e é uma obra de arte. Inaugurado em l947 retrata o estilo
arquitetônico da época.
Guardar a Memória é guardar a
história do povo e preservar sua identidade. Gente sem Memória é sem raízes. O
povo sem passado é povo cujo futuro é sempre um recomeço sem lições. Os países mais desenvolvidos do mundo sabem
da importância de se preservar o passado, e guardam prédios importantes, artes
e elementos originais de cultura como relíquias.
Como exemplo, temos a catedral que
foi tombada e preservou as características arquitetônicas da obra – belíssimo
cartão postal da cidade. Também, o Palácio do Bispo que, restaurado, guarda a
beleza do passado, e a antiga casa de Dr. Agenor Ludgero Alves transformada em
Casa de Cultura pela família Leitão.
Muitas cidades erguem prédios guardando a carcaça da obra primitiva.
Vejo muitas pessoas confundindo
tombamento com demolição. Tombamento é a restauração da obra que poderá servir
para os mesmos fins anteriores ou para outros fins de igual valia, sem
descaracterizar os antigos valores. Demolição é destruir a obra.
Dos tempos áureos do Cine Brasil, não
há caratinguense que não tenha lembranças de filmes, espetáculos teatrais e
cantores famosos passados por essa casa de espetáculos. Caratinga e redondezas
viveram momentos inesquecíveis de entretenimento. Quantos casais se beijaram no
escurinho do cinema… Não só saudades das inocentes carícias fazem a importância
do local, mas toda a trajetória de progresso.
Ainda bem que a justiça, sensível à
questão, sabedora do valor de um bem histórico e atenta ao clamor do povo, suspendeu
a ação. O tombamento – assinado antes pelo prefeito – dará melhor destino ao
estabelecimento.
Manifestações de repúdio à demolição
dão conta da insatisfação dos caratinguenses daqui e de todo país. Está visto:
o Cine Brasil mora no coração da gente.
No mesmo dia em que houve a questão
do Cine Brasil, fomos sacudidos pela notícia do desligamento do Edra da Casa
Ziraldo de Cultura. É difícil ver outra pessoa governando o tesouro que o Edra
concebeu, lutou por ele e inaugurou depois de tantos esforços e tanta
dedicação. Nós acompanhamos a realização do projeto, desde o nascimento à
conclusão. Conhecemos de perto sua luta, seu idealismo, seu sofrimento mesmo.
Sim. Muitas vezes o vimos triste diante das impossibilidades, das dificuldades
que, a cada dia, se interpunham entre seu sonho e o desencanto. Mas com fé,
lidas, orações da mãe santa e companheira, ele venceu etapas e seu ideal tomou
forma e se fez verdade. Dirigia a Casa com zelo, entusiasmo e brilho nos olhos,
recebendo visitantes e eventos a mostrar o benefício que o espaço trazia ao
povo.
Sabemos que o novo dirigente é capaz
para exercer o cargo, mas o que está em jogo, não é a tarefa de conduzir o
estabelecimento. Trata-se da ética – ciência do bem e do bom. Ela lida com
valores e sua palavra de ordem é o respeito. E do respeito surgem outros
valores, como a igualdade, a liberdade, a consideração.
A Casa Ziraldo de Cultura tem a cara
do Edra e guarda a alma dele em cada canto, em cada detalhe. Penso que o novo
dirigente vai se sentir um pouco deslocado, como se carregasse um anel apertado
no dedo, ou um sapato largo no pé.
Diante desse fato, meu pensamento
busca Julimara, primeira-dama, que soube tão bem se conduzir por todo tempo do
governo do marido. Lidamos com ela em muitas comemorações e no dia a dia, e
sabemos da sensibilidade e elegância de seus gestos. Ela sempre considerou os
valores eternos que devem nortear a conduta humana. Por sua força junto ao
mandatário maior do município, sei que poderá intervir com sucesso e levar em
conta o trabalho e o talento do Edra.
Aguardemos.